domingo, 24 de abril de 2011

Rio, congestionamento & bacalhau

Ontem, por volta da 18h30, peguei um congestionamento... na fila do delicioso RIO, de Carlos Saldanha, no Shopping Cidade Jardim. Antes de chegar à bilheteria dei muitas voltas no estacionamento para conseguir uma vaga. 

A intenção era comprar o ingresso para a sessão das 20h30 (em 3D com legendas) e visitar a deliciosa Livraria da Vila lá do Shopping. Ao chegar a nossa vez, só havia um lugar disponível. A moça disse que ainda havia lugar para a sessão das 19h10 (em 3D dublado).

Decidimos: vamos nessa. A gente visita a livraria depois. Apesar de dublado, o filme é maravilhoso. Uma viagem pelas lindas paisagens cariocas soberbamente desenhadas por Saldanha e sua equipe. Como a sessão era dublada, estava cheia de papais e mamães com seus pimpolhos. Mal começou a exibição e um deles soltou em alto e bom som: a arara só voa no final! Arrrghh. Lembrei-me de um amigo de Aparecida que saiu da sessão de Romeu e Julieta bravo, pois disseram para ele que os dois morriam no final.

Hoje de manhã li no Facebook um post da amiga Rachel: “Trânsito no retorno a São Paulo. Parado já no km 64 antes de São Paulo! Traffic on the way back to SP. Stopping at Km 64 from SP. HEEELP!!!!” Respondi para ela que o único congestionamento que peguei nestes quatro dias de São Paulo foi a do cinema narrado acima. Que delícia que é esta cidade para quem fica nela num fim de semana super prolongado. Ela se torna a cidade ideal para todos que a amam.

Fiquei por aqui e acompanhei as notícias sobre os intermináveis congestionamentos que duraram 24 horas, apesar de a gasolina ter chegado à casa dos R$ 3 reais. Minha sobrinha foi para o Vale do Paraíba na quinta e ficou na estrada. Gastou 5 horas até Aparecida, distante 174 km da capital. Se houvessem os trens como antigamente ou como em todos os países civilizados do mundo, ela gastaria cerca de 2 horas.

Quando cheguei a São Paulo ia e voltava para Aparecida no “Trem de Aço”. Adorava. Ia para o vagão restaurante e ficava contemplando a Mantiqueira e o Rio Paraíba. Quando ia ao Rio de Janeiro, pegava o trem das 11 da noite da sexta e voltava no domingo no mesmo horário. Comprava a cabine, dormia gostoso e acordava pronto para a praia, no Rio, e pronto para o trabalho na segunda de manhã, em São Paulo.

E ainda ficam discutindo a construção ou não do trem bala. Nem precisava dele. Bastava que reativassem o Trem de Aço na linha já existente. Mesmo que o trem gaste 10 horas até o Rio, vale a pena fugir dos caminhões, dos buracos e dos congestionamentos da Dutra.

Li também hoje no Estadão que estamos vivendo um “apagão” de combustíveis. Culpa do aumento da frota em circulação e da entressafra da cana. O álcool mais caro está fazendo todo mundo migrar para a gasolina. Na UOL, li que o metrô de São Paulo é o mais lotado do mundo. Um dos motivos, segundo Telmo Giolito Porto, professor de ferrovias da Poli, é a eficiência do metrô que atrai mais usuários.

Ah, li também sobre os congestionamentos nos aeroportos. Chegaaaaaaa!

São 13h27. Ao acabar este post vou abrir um malbec de Mendoza e acompanhar Cláudia na cozinha. Ela sacou do seu livrinho de receitas uma especial para fazer um bacalhau na melhor tradição portuguesa. Eu cuidarei do arroz bem soltinho que, modéstia às favas, é uma das minhas especialidades.

Eu disse bacalhau à portuguesa? Bem, depois do almoço é só vestir as cores da Lusa e torcer para que o time do Canindé despache o São Paulo e esperar que o meu Verdão faça o mesmo com o Mirassol para que, na semana que vem, a gente pegue o Corinthians. Mas esta é outra história para a gente preparar um outro almoço delicioso... sem congestionamento!

sábado, 23 de abril de 2011

Diga-me com quem andas 2: A Missão

Fidelidade segundo o Dicionário Aurélio:
1. Qualidade de fiel; lealdade. 
2. Constância, firmeza, nas afeições, nos sentimentos; perseverança. 
3. Observância rigorosa da verdade; exatidão. 

Fidelidade segundo o Dicionário dos nossos Políticos:
1. Verbete inexistente.

O recém criado PSD (Partido das Sobras do DEM?), criado pelo prefeito Gilberto Kassab, recebeu a filiação de 32 novos políticos. Mais da metade não sabe o significado de fidelidade partidária. Nos últimos três anos trocaram de legenda diversas vezes. O campeão da infidelidade é o deputado Junji Abe, de São Paulo, que já passou pelo PDS, PFL, PL, PFL, PSDB, DEM. Ao se filiar ao PSD, chega à sétima mudança de Partido. Imagino qual será a meta do parlamentar. Conseguir a nota DEZ?

Outros exemplos: Silas Câmara, do Amazonas, foi do PL para o PFL, PTB, PAN, PSC. José Carlos Araújo, da Bahia, circulou pelo PFL, PL, PR, PDT. Eliene Lima, do Mato Grosso, PDT, PSB, PP. O próprio Kassab começou no PL foi para o DEM e agora cria o seu partido. Resta saber se um dia ele irá abandoná-lo.

Os próprios nobres deputados decidiram, em 2007, que um político pode ser punido com a perda do mandato se abandonar sua legenda. Mas – sempre tem que haver um MAS – as trocas serão PERMITIDAS se o detentor do mandato provar que foi perseguido ou se houve descumprimento por sua legenda do programa ou estatuto... Ou – a opção do Kassab – se for criado um novo partido. Pronto. Isso significa que quem se bandear para esta nova sigla fica isento de eventuais processos na Justiça Eleitoral.

Será que quando os nobres políticos criaram essa regra levaram em conta o que pensaria o seu eleitor sobre essa infidelidade? É evidente que não. Definitivamente, a fidelidade partidária dos políticos não é a mesma de seus eleitores. Se eu voto no PXX, quero que o meu representante fique até o fim no PXX. Não quero que ele se bandeie para o PYY que pode não representar as mesmas ideias pregadas pelo PXX que ajudei a eleger.

Senhores nobres eleitores, hoje li que Gabriel Chalita deve se bandear para o PMDB para concorrer à prefeitura de São Paulo na próxima eleição. Como ficam seus eleitores – não é o meu caso – que o elegeram para representá-los no PSB? Traídos, é claro. Traídos? Ah, nobres eleitores, no dicionário dos políticos Fidelidade Partidária é verbete inexistente.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Ladrão que rouba ladrão...

O Assaltante Trapalhão de Woody Allen
O título de uma notícia publicada nesta segunda na UOL me chamou a atenção: Ladrão é assaltado enquanto roubava carro em Porto Alegre. Decupo aqui as cenas do inusitado assalto.

Cena 01: Um ladrão, munido de um 38, rende um casal.

Cena 02: Quando ele se preparava para levar o Ecosport, um Prisma escuro – também roubado – se aproxima e três homens armados descem e abordam o casal e o ladrão azarado: Bá che, perdeste!

Cena 03: O trio leva o carro do casal e, de quebra, o instrumento de trabalho do colega de profissão que, assustado...

Cena 04: Foge a pé.

Depois de ler sobre esse duplo assalto, lembrei-me do livro Mas Será o Benedito?, de Mário Prata. Nele, o escritor publicou expressões, provérbios e ditos populares. Uma delas a famosa: Ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão.

Prata conta que a frase é atribuída a Sir Francis Drake (1541-1596), cunhada durante a metade do século XVI. Apesar do "sir", era um grande pirata a serviço dos ingleses. Saqueava caravelas em pleno mar e desviava o roubo. Como as caravelas já levavam material roubado, ele inventou essa máxima para se eximir da culpa e limpar a barra da Inglaterra. Agia muito na América Central.

Lembre-me também de uma a cena hilária do filme Um Assaltante bem Trapalhão (Take the Money and Run, 1969), primeiro filme de Woody Allen – um falso documentário sobre a vida de Virgil Starkwell, de sua infância à prisão por roubo a banco, passando por sua educação moral e musical e seus problemas com mulheres.

Virgil/Allen e sua quadrilha planejam um roubo a um banco e quando entram e dão a voz de assalto, simultaneamente outra quadrilha solta o mesmo “é um assalto!”. A confusão do duplo assalto é resolvida com uma enquete feitas por Virgil com os clientes e funcionários do banco: “quem ser assaltado por minha quadrilha?” Noooooooo. “E pela outra? ”Yesssss”. Só mesmo na cabeça do Woody Allen.

Para finalizar este post policial, lembrei também das minhas aulas de latim na USP com o querido professor Mendonça. Ele adorava trabalhar frases e expressões com seus alunos.

Uma delas: Furem fur cognoscit ou o ladrão conhece o ladrão... Menos em Porto Alegre, mestre Mendonça, onde, pelo ocorrido, os ladrões de lá estão contrariando esse dito secular.

domingo, 17 de abril de 2011

BOLA DE GUDE















Revisito a manhã
alva manhã
como nos tempos de menino -
pés descalços molhados da relva
e a luz - tanta luz
refletindo diagonalmente
como um prisma
a tua imagem distante:
os teus lábios de mel proibidos
            os teus olhos eternamente fugindo dos meus
            as tuas mãos sempre dizendo adeus

Ao revisitar menino, aquela distante manhã
encontro a lúdica bolinha de gude multicor
cigano, eu a transformo numa miniatura
de bola de cristal da bola de cristal
da cigana do circo
em seu cerne, vislumbro os dias ulteriores
a essa distante manhã, da maneira que desejo:
            olha lá você, mulher, esguia, elegante
            absoluta, radiante, iluminada, colorida,
            linda, dona do meu futuro

Volto da manhã
alva manhã
como nos tempos de adulto -
pés calçados de tanta incerteza
e a luz - tanta luz
brilha em meus olhos ainda menino
neles a tua imagem bem mais real
da que imaginei lá no distante

À minha chegada, procuro atônito
no fundo do baú da infância
a minha lúdica bolinha de gude multicor
necessito saber se ainda tenho o dom
de ver nas suas veias os dias ulteriores
a esse futuro presente
onde espero ver-te ao meu lado -
nós dois eternamente meninos.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Você já fez o seu Ctrl + Alt + Del hoje?

A FADA SAFADA

Nesta semana a amiga Cristina me contou que o filhinho de uma amiga viu a máquina de escrever que a mãe tirou no fundo do baú durante uma arrumação num quarto das bagunças e soltou a pérola: “nossa mamãe, que legal! Onde está o monitor?”

“Filho, isso é uma máquina de escrever. Você coloca o papel aqui e vai datilografando”. “Nossa, que legal, mamãe! Não precisa de monitor e já vem com a impressora dentro.”

Esta história me levou à minha juventude em Aparecida. O nosso sonho era fazer um curso na Escola de Datilografia da Professora América. A gente imaginava que o diploma de conclusão daquele curso super concorrido, que durava três meses, abriria todas as portas do nosso futuro.

Eu fiz. Um amigo meu não acredita que teve até formatura com paraninfo, pompa e circunstância no Umuarama Clube. Dona América juntava todas as turmas que iam se formando a cada trimestre e promovia aquela festança coletiva no final do ano. Não sei em qual gaveta do meu passado ficou perdido aquele diploma, mas ele foi importante para conseguir o primeiro emprego: apostileiro de um cursinho pré-vestibular. Se hoje eu sou super rápido na digitação (com todos os dedos), devo ao diploma da Escola de Datilografia da Professora América.

ASDFG. Lembro-me que do primeiro exercício em que tínhamos que datilografar A FADA SAFADA, com uma tábua cobrindo o teclado da velha Remington.

Lembrei-me desta história ao ler hoje na UOL Tecnologia uma entrevista com David Bradley, o pai do Ctrl + Alt + Del. Ele é aposentado da IBM e durante 30 criou uma série de atalhos que a gente usa cotidianamente no computador e nem imagina quem perdeu horas pensando em como melhorar a nossa vida no mundo virtual. Quem quiser conferir é só clicar aqui: http://bit.ly/fNsHde.

Eu disse clicar! E tem mais: Ctrl + Alt + Del, undo, deletar, resetar... Quantas palavras tivemos que incorporar ao nosso dia a dia depois que saltamos da velha máquina de escrever para os PCs, MACs e Ipads. O filinho da amiga da minha amiga se encantou com a velha máquina de datilografia tanto quanto outra criança que viu a mãe fotografando numa máquina analógica e queria ver na telinha como havia aparecido no clic. “Filho, essa não dá pra ver. Tem que mandar para um laboratório para revelar”. Revelar? Que verbo esquisito!

A mesma amiga Cris do começo deste post contou uma ótima. O marido da amiga dela mantém uma loja de televisores usados em Itapecerica da Serra. Um senhor chegou para adquirir um aparelho usado e disse: “Esta televisão tem feição ou só proseia?” A amiga me disse que a dela está neste estado: só proseia, não tem feição. Por isso, neste final de semana ela vai levar o aparelho para um técnico, pois não aguenta mais assistir só o proseio do Jornal Nacional, sem as feições do Bonner e da Fátima.


PS: lembro-me de quando fui apresentado ao UNDO e fiquei encantado. Quando errávamos alguma coisa bastava dar um CTRL Z para voltarmos à ação anterior. Era tudo o que eu queria para a minha vida: uma tecla UNDO que eu pudesse apertar para corrigir os erros que cometi.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Um misto quente sem presunto

É "pur pididu"
As malas já estavam prontas para o retorno ao Brasil depois de um ano de pós-graduação na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto. Cláudia e Paula resolveram pedir uma pizza algumas horas antes do embarque.

Elas se lembraram que havia sido inaugurada uma nova pizzaria no bairro e que estavam com uma promoção incrível: quem comprasse uma pizza ganhava uma coca-cola de dois litros. Como havia muitos amigos, Cláudia ligou e pediu duas pizzas e, consequentemente, achou que levaria os dois refrigerantes da promoção. Ledo engano. 

Alô... é da pizzaria.
Pois sim.
Eu queria duas pizzas: uma de mussarela e outra de calabresa. Conforme a promoção eu ganho duas cocas, certo?
Não, minha senhora, a promoção é “pur pididu”, disse a portuguesa do outro lado da linha.
Cláudia insistiu: mas eu estou pedindo duas pizzas. Consequentemente tenho direito a duas cocas.
Não, minha senhora. A promoção é “pur pididu”.
Está bom. Então me vê uma pizza de mussarela e a coca da promoção.
Pois não, qual o endereço?

Cláudia desligou o telefone e ligou novamente: Alô... é da pizzaria.
Do outro lado a mesma voz: Pois sim.
Eu queria pedir uma pizza de calabresa e a coca da promoção. Pois não, qual o endereço?

Algum tempo depois as duas pizzas chegaram ao mesmo endereço acompanhadas de duas cocas... “pur pididu”.

A gente sempre ri quando comenta essa história e eu sempre me lembro de uma nota que li numa coluna de jornal daqui. Um brasileiro flagrou e fotografou um outdoor de uma campanha de um fabricante de sorvetes de lá: “Picolé só faz mal se você engolir o pau”. Genial.

Mas eu sou testemunha do serviço mais cartesiano que já vivi. Nos anos 80 eu trabalhava na matriz do Banco Itaú, na Rua Boa Vista. Quando eu perdia a hora, deixava para tomar o meu café da manhã na lanchonete que o banco mantinha no edifício somente para funcionários. O sistema dos “pididus” era por número e não havia no cardápio um correspondente ao meu predileto... queijo quente. Todos os dias eu fazia a graça com a garçonete.

Por favor, me veja um queijo quente! Ah, esse não tem. Então eu pedia um misto quente. Quando o sanduíche chegava, eu retirava todo o presunto. Repetia “meu pididu” todos os dias.

Com o passar to tempo, a moça foi ficando mais íntima e repetia com um sorriso cada dia mais largo: Ah, esse não tem... Ah, esse não tem. Ah, esse não tem. Ah, esse não tem... Até que um dia ela disse a frase mais incrível que eu pude ouvir naquela lanchonete:

Por que o senhor não pede um misto quente... sem presunto?
A frase quase me deixou atordoado e a ficha demorou alguns segundos para cair.

Pode? Sim, pode! 

A partir daquele santo dia eu chegava e nem precisava pedir. A moça se adiantava: “o senhor vai querer um misto quente sem presunto?”

Simmmmmmmmmm!

segunda-feira, 11 de abril de 2011

O mundo sem nós... no Bom Retiro

A natureza resiste no Bom Retiro
Em 2010, li o curioso O mundo sem nós, livro de Alan Weisman, professor associado de jornalismo da University of Arizona e especialista em livros científicos. O ponto de partida da obra é a premissa: o que aconteceria com o nosso planeta se todos os seres humanos fossem varridos de repente? Com a nossa ausência, o autor salta no futuro e vislumbra como a natureza destruiria – e em quanto tempo – tudo o que o homem construiu em milênios.

Embasado cientificamente, Weisman prevê, por exemplo, que grande parte da atual infra-estrutura do planeta começaria a ruir logo nos primeiros meses, pois esta exige muitas equipes para sua manutenção. Outro exemplo citado é o metrô de Nova York, que seria inundado no dia seguinte, pois os lençóis freáticos dos subterrâneos da cidade dependem de o homem apertar o botão para funcionar as bombas que impedem que isso ocorra.

Nas décadas seguintes, devido às intempéries, casas e edifícios comerciais desmoronariam e objetos banais como panelas de aço inoxidável poderiam durar milênios e o tormento dos plásticos que um dia o homem inventou permaneceriam intactos por centenas de milhares de anos, até que micróbios evoluíssem para consumi-los.

Nesta semana O mundo sem nós, veio-me à lembrança quando vi (e fotografei) a plantinha acima que insistiu em brotar no telhado de um prédio de quatro andares aqui no Bom Retiro, em frente ao edifício onde trabalho. Todos nós podemos imaginar como a semente foi parar lá, mas não como a planta conseguiu crescer naquele telhado tão inóspito e, sobretudo, como resistiu ao nosso verão de 2011, tão castigado pelo sol e pelas chuvas. Imagino como ela resistirá daqui para frente.

Se a plantinha estivesse no livro de Weisman, com o passar dos anos, se tornaria uma frondosa árvore e engoliria o edifício do Bom Retiro.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Diga-me com quem andas...

Li hoje que no próximo sábado se juntarão em frente ao MASP, na Av. Paulista, organizações separatistas, militares extra-quartel, católicas radicais e grupos de extrema direita. O motivo? Um ato de apoio ao deputado Jair Bolsonaro, organizado pelo Ultra Defesa, um grupo de extrema direita comandado por um jovem de apenas 23 anos, que diz contar com 28 participantes e 30 simpatizantes.

Essa notícia chegou como um filme na minha cabeça. Começou lá na distante Alemanha nazista, passou pela Itália fascista, pela Espanha franquista e deu um pulo até a Marcha da Família com Deus pela Liberdade e o CCC dos anos de chumbo daqui.

A matéria diz que o Ministério Público e a PM irão acompanhar o ato para que a passeata não extrapole “os limites da manifestação de expressão”. O promotor Eduardo Valério, da área de Inclusão Social e Direitos Humanos do Ministério Público de SP, diz que a “Homofobia ainda não é crime, porque o projeto que tipifica isso como crime ainda não passou no Congresso Nacional.”

Espero que essa afirmação do promotor não seja uma senha para que os organizadores deste triste ato extrapolarem os limites. Espero também que este ato não manche a história da Av. Paulista, um espaço tantas vezes utilizado pelos brasileiros para reivindicar a democracia, sobretudo quando ela estava mais frágil por culpa, entre outros, daqueles radicais de direita de triste memória.

domingo, 3 de abril de 2011

Saudades de Baden Powell

Autógrafo no LP L`LÂme de Baden Powell em 1.979
Estava eu neste domingo chuvoso navegando na internet quando vi que Riso Maria Dersu, uma amiga do Facebook, adicionou um vídeo do João Gilberto cantando Estate. Curti o João e como uma coisa puxa a outra, vi na barra de rolagem do Youtube à direita diversos vídeos de Baden Powell.

Não resisti e cliquei em Tristeza, um vídeo de 1966 quando o jovem violonista estava no auge de sua forma. O vídeo é uma preciosidade. Acompanhado por um trio, Baden arrasa no improviso e faz uma releitura deste clássico – uma música relativamente simples – transformando-o num concerto espetacular.

Imediatamente, minhas lembranças saltaram para uma noite muito especial que aconteceu no Tuca em 1973, ano em que cheguei em São Paulo. Eu estava lá e tive o privilégio de assistir àquela noite memorável em que Baden Powell se juntou aos seus mestres Dino e Meira e a cantora Silvia Maria. Saí daquele show mais encantado ainda com o violonista que eu conhecia apenas da vitrola. Ah, saí também com um autógrafo do ídolo no método de violão Lições Preparatórias, de A. Bernardini, em que eu estudava na época. O autógrafo diz: “Ao Dirceu com apreço, um abraço de Baden Powell e Silvia Maria, 21/11/73”. Lembro-me de Baden dizendo: “mas estuda mesmo”.

A partir, daí comecei a comprar todos os vinis de Baden que chegavam ao nosso mercado, porque a maioria dos seus álbuns foi gravada na Europa, onde viveu por mais de 20 anos. Ainda guardo comigo e ouço, de vez em quando, os 12 LPs gravados entre Alemanha e Paris. Um, em especial, ouço sempre: o LP gravado ao vivo, em 1979, no Teatro Procópio Ferreira, na Rua Augusta.

Quando anunciaram a temporada, corri ao teatro e comprei o ingresso para a estreia, na primeira fila. Nesta época eu acabara de lançar o meu livro de poesia Canto em Si e levei um exemplar “autografado” para Baden no camarim após o show. Contei então que a edição era minha e que eu estava vendendo em tudo quanto é espaço na cidade. Para minha surpresa, ele falou: “pode vender aqui no meu show”. Foi o máximo. Durante toda a temporada fui autorizado pela produção a vender o meu peixe na entrada do teatro. De quebra, assisti a temporada inteira... De graça.

Tenho uma história curiosa para contar sobre este show. Muito tempo depois, conheci Lilian Carmona, a baterista daquele show. Conversamos a noite inteira sobre aquela temporada histórica. Contei para ela o que narrei acima e, de repente, ela me contou o que aconteceu nos bastidores. Contrataram o trio: baixo, bateria e percussão. Os músicos chegavam para o ensaio às 11 da manhã e ficavam esperando alguma coisa acontecer. Lá pela uma da tarde, iam almoçar, voltavam... E nada. Baden se trancava no camarim e tocava sozinho o tempo todo.

Assim foi durante uma semana. Os músicos chegavam, almoçavam e ficavam esperando Baden descer para o ensaio. Somente no dia da estreia, com o palco montado, Baden chama todos para ensaio... No camarim. Foi assim mesmo, disse-me Lilian. Os músicos levaram seus instrumentos para o camarim, ensaiaram apenas uma vez com Baden e estrearam à noite... Comigo na primeira fila. Vá entender a cabeça dos gênios.

Depois deste show ainda vi Baden mais três vezes: no Circo SP, que funcionou durante alguns anos lá na Augusta com a Caio Prado; no 150 Night  Club, no Maksoud Plaza; e o último show, num teatro, que não lembro o nome na Rua do Paraíso, alguns meses antes da morte do violonista.

Para quem quiser ver o Canto de Ossanha com que Baden abriu o show do Procópio Ferreira, deixo o link do Youtube. É uma gravação que Baden fez para o Fantástico em 1979: http://www.youtube.com/watch?v=WVQ3Hg9d19M&feature=related