sábado, 29 de janeiro de 2011

Lavo o sangue com as mãos deste justo

No feriado do dia 25 passei o final de semana em Aparecida. No sábado à noite encontrei com Maurício e Dora lá no Ouro Fino – aquele restaurante da minha juventude que comentei no post My Last Pictures Shows, no dia 15 de janeiro. Fazia tempo que não encontrava o casal amigo daqueles nossos anos verdes. Imediatamente, comentei sob o blog e o post A paixão de Cristo segundo Padre Marino, onde relatei parte das histórias daquela inesquecível montagem do GUTU – Grupo União Teatral Umuarama. Aliás, no final prometi: A paixão de Cristo segundo Padre Marino continua noutro post, pois este centurião ainda tem muitas histórias dos bastidores para contar.

E é o que farei agora, mesmo porque o encontro com Maurício foi providencial para que eu pudesse sanar muitas dúvidas, sobretudo quanto ao nome dos atores e seus respectivos papéis. Eu não lembrava, por exemplo, que Altair Turíbio, embora não tivesse o physique du rôle para interpretar o Nazareno, foi o escolhido para esta empreitada por ser locutor da Rádio Aparecida e, consequentemente, por ter aquela voz empostada FM de ser.

Turíbio era mais velho, profissional conceituado e com salário de gente grande, coisa que não acontecia com mais da metade daquele grupo adolescente, que vivia da mesada do pai. Como ele gostava de um uísque, e para atenuar o nervosismo de sua estreia na ribalta, contratou um garoto para ficar com o balde de gelo, a garrafa e o copo. Toda vez que o Nazareno/Turíbio saía de cena, o garoto estava lá na coxia com o copo estendido. Um gole rápido goela adentro e lá voltava Turíbio para a cena. A garrafa secou antes do fim da temporada.

Outra cena hilária que aconteceu no dia da estreia foi a do julgamento de Jesus e Barrabás (interpretado pelo Índio). Maurício fazia Pilatos e após dizer: "Quem é que vocês querem que eu solte: Jesus ou Barrabás?”, o povo – representado por uns 30 figurantes que ficavam no canto esquerdo da platéia, dois metros abaixo do palco – passou a gritar Barrabás, Barrabás. Índio decidiu então improvisar e saiu correndo em direção ao povo gritando todo feliz: “obrigado meu povo, obrigado meu povo”. E, para a surpresa de todo mundo, se atirou lá de cima do palco direto para os braços dos figurantes. Como o povo sofre. Não me lembro se alguém se machucou. Ao final da apresentação, Índio recebeu uma broca do diretor Padre Marino e nas duas seguintes apresentações não mais improvisou.

A cena continuou com a cena clássica em que o nosso Pilatos/Maurício lava as mãos. O nervosismo também tomou conta do nosso Pilatos/Maurício que errou justamente a frase que metade do planeta sabe de cor: “Lavo o sangue com as mãos deste justo.” Da plateia, é claro, veio aquele burburinho, pois todos haviam sacado que aquele não era bem o texto que Maurício deveria dizer. Que mico, hein Maurício?

Outra cena inesquecível é a do final. Amarrado na cruz, o mau ladrão Gestas/Tadeu dá a seguinte fala: “malditos romanos que me pregaram e me crucificaram”, seguido de uma cuspida nos soldados ao pé da cruz. Junto com ele estavam a Tutuza (Maria) e Terezinha Galvão (Maria Madalena). Tadeu se entusiasmou e o que deveria ser uma simples cuspida virou uma catarrada, que acertou na mosca, digo na orelha de Maria Madalena, que com as mãos postas como requeria a cena, disse com os lábios sem emitir qualquer som: “Tadeu, seu fdp, você me paga”.

Na sequência, o gran finale. Após a morte de Jesus, a sonoplastia solta a música grandiosa seguida de raios e trovões acentuado pela iluminação. A cortina se fecha. Aplausos. Abre. Mais aplausos. Fecha e abre. Fecha e abre... e fecha. Todo o elenco se cumprimentando em suprema felicidade devido ao sucesso, enquanto a direção de palco ajuda Jesus, Gestas e Dimas descerem da cruz onde estavam amarrados.

Apesar de o espetáculo ter terminado, Olavo, que fazia o Dimas (o bom ladrão) continuou imóvel lá no alto da cruz. A gente lá de baixo: “Olavo, pode parar de representar, o espetáculo acabou.” E nada. Olavo continuava mortinho da silva, como o fizera na cena final. “Olavo, Olavo...” Só então percebemos que ele tivera um mau súbito lá em cima e estava um tanto “desmaiado”. Foi aquele corre corre para socorrê-lo com sal e uns tapinhas na cara. “Onde estou, onde estou?”, disse ao recuperar a consciência.

Faltou dizer que fizemos uma sessão extra para os soldados da aeronáutica em Guaratinguetá. Montamos o palco num praticável montado no pátio, pois não havia teatro lá na Escola de Especialistas da Aeronáutica. Então, a iluminação teve que ser feita de baixo para cima, por todos os lados do palco. Aquele batalhão de soldados se acomodou  em cadeiras e lá fomos nós representar A Paixão de Cristo. Lá pelas tantas, Tutusa, que fazia Maria entra em cena com um vestido branco de cetim, iluminada por detrás do palco... de baixo para cima. Não deu outra, a iluminação realçou seu corpo, revelando as roupas íntimas. Os soldados sibilaram em uníssono ssssssssss. Tutusa caiu em prantos e foi difícil convencê-la retornar ao palco. Fecha o pano: rápido!

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