sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Bandeira e eu desejamos um Feliz Natal

Fausto Padilha, com o Grupo de Teatro do Américo Alves
Estou em Aparecida para o Natal com a família e os amigos. Ontem à noite comemoramos o aniversário da mana Rose. Metade da cidade estava aqui na casa da dona Lola e os papos e a cantoria prosseguiram até a madrugada. Foi uma delícia reencontrar os amigos daqui, sobretudo o professor Fausto Padilha, que deu aulas para metade da festa, além de dirigir incontáveis quase futuros atores nas inesquecíveis montagens do grupo de teatro do Américo Alves. Foi inevitável evocar noite adentro as lembranças daquela nossa cidade dos anos 70 e 80.

Acabei de acordar e a chuva de ontem deu uma trégua. O sol veio iluminar este dia de véspera de Natal. Natal? Puxa é mesmo. Vim para o blog com o propósito de postar a minha mensagem para esta data tão especial.  Lembrei então do Bandeira. Ninguém melhor que o poeta para ser o meu porta-voz deste Natal de 2010.

Versos de Natal

Espelho, amigo verdadeiro,
Tu refletes as minhas rugas,
Os meus cabelos brancos,
Os meus olhos míopes e cansados.

Espelho, amigo verdadeiro,
Mestre do realismo exato e minucioso,
Obrigado, obrigado!

Mas se fosses mágico,
Penetrarias até ao fundo desse homem triste,
Descobririas o menino que sustenta esse homem,
O menino que não quer morrer,
Que não morrerá senão comigo,
O menino que todos os anos na véspera do Natal
Pensa ainda em pôr os seus chinelinhos atrás da porta.

Manuel Bandeira (Lira dos cinquent' anos)

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

INSS, a Missão (40 minutes of agony)

Cheguei à Brigadeiro Luiz Antonio, 1266, às 16h10 desta quarta-feira, 22 de dezembro. Um servidor solícito me forneceu a senha 116. O que fui fazer lá naquele posto do INSS? Buscar minhas Carteiras de Trabalho, deixadas lá em agosto, quando dei entrada na papelada para saber se eu poderia solicitar a minha aposentadoria.

Afinal, a minha primeira carteira carcomida, tirada em Guaratinguetá, data de 1972 e o meu primeiro carimbo como trabalhador com carteira assinada, de 1973. Contas feitas, eu tenho 37 anos de trabalho... alguns forçados. Imaginei então: já posso pedir a minha APOSENTADORIA, com caixa alta.

Ah ah, ledo engano. O INSS destruiu o meu sonho pelo correio um mês antes: “Dirceu, você ainda não pode se aposentar. Tem que trabalhar mais, mais, mais... até os 65 anos.” Isso dito por uma voz soturna e gutural de algum daqueles servidores do posto da Brigadeiro... imaginei eu enquanto esperava naquela poltrona azul durante 40 minutos para recuperar as minhas preciosas Carteiras de Trabalho.

Quando estive lá em agosto, deram-me um documento com as iniciais DR – não de Dirceu Rodrigues e, sim, um Documento Retido. Então, a senha 116 era a “senha” para que eu pudesse resgatar as minhas preciosas Carteiras de Trabalho, testemunhas destes 37 anos de sangue, suor e muitas lágrimas.

Um vídeo acima dos guichês de atendimento me informava que havia apenas dois servidores que, naquele momento, atendiam as senhas 114 e 115. Isso significava, cria eu, que seria o próximo a ser chamado. Seria? Bem, uma senhora idosa chegou e ganhou a senha 117. Passou na minha frente, é claro, e não esbocei nenhuma reação, afinal, sou um gentleman e sei respeitar a lei dos mais velhos, em todas as situações. Para me distrair, fiquei observando o duelo entre os minutos e os segundos do meu relógio, ao mesmo tempo em que fazia risquinhos na parede da minha imaginação, como um prisioneiro, que conta os dias para a reta final de sua liberdade.

Concomitantemente, fiquei observando a rotina daquele fim de tarde da repartição, que encerraria o expediente às 17 horas. O moço das senhas só tinha uma função: emitir senhas. Durante 40 minutos em que estive lá pude observar que ele não fazia nada além disso. Numa outra mesa, uma outra servidora não conseguia acessar seu computador e o servidor número dois – um dos que atendia às senhas – teve que deixar seu cidadão em atendimento por pelo menos duas vezes para reiniciar o micro da colega.

Uma terceira servidora chegou ao guichê de atendimento. Para me atender, imaginei. Mas, não, ficou de trelelé com a do micro travado por 10 minutos, computei nos risquinhos da minha imaginação. Falaram do Natal, do Ano Novo, dos presentes... mais um pouco e estariam no carnaval. Foi então que o servidor número dois me chamou, após 40 minutos. Entreguei para ele o meu DR e em dois minutos ele pegou no armário um envelope com as minhas Carteiras de Trabalho e em quatro minutos eu estava liberado.

Guardei as minhas preciosas, respirei fundo e fui-me embora lembrando do cartaz estampado com destaque na parede da repartição: “Desacatar funcionário público é crime previsto em Lei.” Era para intimidar? E o funcionário público quando desacata o cidadão? Tem algum crime previsto em lei para isso?

Saí do posto da Brigadeiro com uma certeza e uma sensação esquisita: sou um cidadão que contribuiu durante 37 anos para o INSS e vou ter que trabalhar ainda muito e muito e contribuir mais ainda para continuar a manter um serviço deste nível que a gente tem que engolir sem poder reclamar, pois senão a Lei pune.

Ah, a pergunta que não quer calar: por que o servidor que distribuía as senhas não entregou as minhas carteiras? Ele levaria – como disse acima – apenas 2 minutos para encontrá-la, um ínfimo do tempo em que ele ficou ocioso nos quarenta minutos que lá permaneci. Aí o nosso papo seria outro. Eu sairia feliz e escreveria uma crônica elogiando os excelentes serviços prestados pelo INSS.    

Encantos

Hoje deixo para vocês o meu poema Encantos. Junto com ele o meu Feliz Natal.

E se eu fosse.
E se tu fosses.
E se nós fôssemos.

Neste dia, eu tomaria a tua mão
E te levaria por todos os cantos
Da imaginação.

E quem sabe então
Não veríamos o que está mais além
Dos cantos da imaginação.

É preciso, sempre, deixar rolar o canto
E com ele preencher todos os cantos
Pois vem dia em que poderemos estar afônicos
E necessitarmos de um canto
Para deitar os nossos desencantos.

Aí, então, quem sabe, a gente encontre
Aquele canto que um dia espantou a tristeza
De tantos outros cantos.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Monumento Mínimo, chuva e Coreias

Monumento Mínimo, de Néle Azevedo
Ontem por volta das 18h30 saí do trabalho, no Bom Retiro, e caminhei até a estação Tiradentes do Metrô, sob o sol do horário de verão e um calor insuportável. Queria chegar logo em casa, pois lá pelas nove iria conhecer o novo atelier da amiga Néle Azevedo. Troquei de linha na estação Paraíso e segui até a estação Sumaré.

Na parada do trem na Consolação, entrou Beatriz que me deu aquele sorriso. Retribuí de imediato e começamos a conversar sobre onde iríamos passar o Natal e Ano Novo. Eu a ouvia, falava, e, lá no fundo dos meus chips, tentava encontrar o arquivo com a informação mais preciosa naquele momento: de onde é mesmo que conheço Beatriz? Bem, naquele momento eu ainda não sabia seu nome. Perguntaria uma hora depois da tempestade que nos segurou até oito da noite na Sumaré.

Isso mesmo, quando descemos na estação, um dilúvio com muito vento prendeu todos que ali desembarcaram por mais de uma hora. De repente não resisti e perguntei: qual é mesmo o seu nome? Beatriz. Meio sem jeito, emendei: de onde a gente se conhece? A jovem Beatriz estudante de design gráfico na Belas Artes abriu um sorriso bonito e disse: a gente não se conhece. Nossa, eu tinha certeza de que a conhecia de algum lugar. Continuamos proseando até que a chuva passou e cada um tomou o seu rumo. Ela embarcaria às 11 da noite para Maceió.

E eu... como já era tarde, fui direto para o delicioso e aconchegante atelier de Néle Azevedo. A amiga criou o Monumento Mínimo – projeto premiado em que ela expõe milhares de bonecos de gelo em espaços públicos, que vão derretendo lentamente até se liquefazerem. Em setembro de 2009, seus bonecos derreteram nas escadarias do Gendarmenmarkt, em Berlim, durante um protesto mundial sobre o aquecimento global. Sua arte ganhou a primeira página dos principais jornais do mundo. A artista realizou a mesma performance em países como a França, Itália, Portugal, Cuba, Alemanha e Japão.

Fiquei na festa até meia-noite, tempo em que conheci muitos amigos da artista, um deles o professor de comunicação Aidar. Cada um com sua taça de tinto que nunca ficou vazia, conversamos bastante sobre pessoas & histórias que temos em comum até que chegou Inês, outra amiga em comum e o trio repartiu outras histórias. Conheci também a super simpática gaúcha gremista Lu, que não parou de falar um minuto sequer sobre a derrota do Internacional para o Mazembe. Bá, che!

A anfitriã Néle não parou um segundo. Recebia quem chegava e mostrava com entusiasmo seu novo espaço no planeta São Paulo, de onde sairão as ideias para as performances no planeta. Hoje ela me ligou para contar mais uma novidade. Acabou de receber um convite para fazer sua performance na Coreia. Coreia do Norte? – brinquei. Não, a do Sul.

Pensando bem, Néle, por que não nas duas Coreias? Quem sabe, com a beleza do teu trabalho, você não conseguiria derreter o coração daquele maluco que dita as leis na do Norte, ao mesmo tempo em que provoca a do Sul?

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Lázaro Ramos, A Velha Sentada & simpatia

Lázaro Ramos bate-papo na Biblioteca de SP
Quanto o mediador Mario Silva abriu o bate-papo para as perguntas da platéia, um garoto juntou toda sua coragem e, com uma voz tímida e quase ininteligível, disparou: - Foi você quem trabalhou no Ó paí, ó?
Lázaro Ramos soltou uma sonora e gostosa gargalhada. Respondeu dizendo que quando a produção discutia o título do filme chegaram à conclusão que este foi o pior da história do cinema nacional. Ganhou este troféu e muito público: 450 mil pessoas foram para o cinema e milhões viram na televisão, depois que virou minissérie.
O encontro aconteceu ontem à tarde na Biblioteca de São Paulo e precedeu o lançamento de A Velha Sentada, livro que é parte de um projeto que levou sete anos para ser concluído, e que trata das consequências do bullying na vida das crianças.
Bom humor e simpatia não faltaram no encontro com este baiano bom de prosa. Em quase duas horas contou sua trajetória de menino pobre em Salvador até a fama; falou da avó Edith, que empresta o nome à personagem de A Velha Sentada; dos amigos de Salvador; e de seu trabalho como embaixador da Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) no Brasil.

Sobre o amigo Wagner Moura contou um quase incidente que aconteceu entre eles durante um exercício que a preparadora de atores Fátima Toledo propôs para a dupla durante o processo de produção do filme Cidade Baixa. Sem querer, Lázaro acertou uma joelhada em Wagner, que tentou retrucar com vários socos. Depois de um: o que é isso, meu amigo, os dois se abraçaram e choraram.

A plateia não só ouviu atenta as histórias, como levou para casa algumas lições que Lázaro Ramos passou com grande sabedoria. “O seu lugar é onde você sonhar estar”. “Ler é poder. Leiam todos estes livros que estão aqui na biblioteca.” “Comunidade. Adoro esta palavra.” “A gente tem que cuidar da gente”. Esta última dita por um frequentador de uma das muitas bibliotecas que criou nas comunidades de Salvador.

Ao fim do bate-papo, o ator e escritor foi atencioso com todos os pedidos de fotos e autógrafos no seu A Velha Sentada. E ele não para. Às quatro da tarde levantou acampamento. Foi para a Livraria Saraiva, do Shopping Center Norte, começar todo esse ritual novamente.

Ah, ia me esquecendo do principal. Lázaro Ramos falou com muito amor sobre o significado da palavra amar. Depois disso, todos os que lá estavam passaram a amá-lo ainda mais. Para terminar este nosso bate-papo, nada melhor do que reproduzir aqui um trecho de A Velha Sentada:

"O tempo é muito lento para quem espera
Muito rápido para quem tem medo
Muito longo para quem lamenta
Muito breve para quem festeja
Mas, para quem ama, o tempo é eterno."

Para quem quiser saber mais sobre o livro é só clicar no site da Editora Uirapuru: http://www.editorauirapuru.com.br/

domingo, 19 de dezembro de 2010

Singrar

Comecemos a semana com mais um poema do livro Canto em Si. A cantora e compositora Nicole Borger não só fez uma bela música para o poema Singrar, como o escolheu como título do CD. Uma boa semana para todos. Quem quiser conhecer a música é só acessar o site http://www.nicoleborger.com.br/

De um estio instante
Fiz um longo momento,
De um longo momento
Fiz eternidade constante.

E naveguei na plenitude dos dias,
Ancorando no cais da ilusão.
Sem me preocupar com os recifes,
Inventei minha rota, minha embarcação.

Singrar, singrei,
Mas acabei me afogando
No mar das lágrimas que inventei. 

sábado, 18 de dezembro de 2010

Se eu me chamasse Raimundo...

Ensaio de Se eu me Chamasse Raimundo em 1986
“De tudo ficou um pouco, do meu medo do teu asco, dos gritos gagos, da rosa ficou um pouco...” Assim começava o espetáculo Se eu me chamasse Raimundo, que montamos em 1986. Em seguida, a cantora Rosa Maria passeava pelo cenário que reproduzia uma cidadezinha de Minas cantando: “Ó Deus salve o oratório; Ó Deus salve o oratório, onde Deus fez a morada...”

A direção era de Herton Roitman. O roteiro era meu e partia do princípio “uma rua começa em Itabira, que vai dar no meu coração. Uma rua começa em Itabira, que vai dar em qualquer ponto da terra.” A música de Milton Nascimento ponteava o espetáculo.

Após elaborar o roteiro, criar o Grupo Luz e chamar Herton Roitman para dirigir, eu tinha a missão quase impossível para finalmente levar à cena o espetáculo: conseguir a autorização do poeta Carlos Drummond de Andrade para poder estrear. Consegui seu telefone. Liguei.

- É da casa de Carlos Drummond de Andrade?
- Sim.
- Gostaria de falar com ele!
- É ele!

Foram os 15 minutos mais longos da minha vida. À voz de Drummond, suei frio. Quase gaguejando, falei do meu propósito de montar um espetáculo com poemas dele. Ele retrucou dizendo que a poesia estava no papel e lá é que deveria morar. Em princípio, era contra o que eu estava tentando fazer. Mas, desandei a falar e convenci, vejam só: eu convenci o poeta Carlos Drumond de Andrade de que ele deveria liberar a montagem de Se eu me chamasse Raimundo para correr pelas escolas de São Paulo em 1986. Claro que ele pediu que eu enviasse o roteiro para que ele pudesse avaliar.

Duas semanas depois liguei novamente. Drummond aprovou o roteiro e o Grupo Luz pode estrear a minha versão de sua poesia, embalada pela música do Milton Nascimento. Fizemos uma temporada de três meses no Assobradado do TBC e, em seguida, percorremos as escolas da capital até o final de 1986.

No início de 87, encotrei minha amiga Neide Rezende, professora de literatura da Faculdade Senador Fláquer, em Santo André. Falei sobre o espetáculo e combinamos de eu fazer um recital das poesias de Drummond para seus alunos sozinho, pois o Grupo Luz já havia sido dissolvido. Combinamos uns dois meses antes. Nesta época, eu era gerente do Pirandello e minha folga era às segundas-feiras. O tempo passou e o recital para os alunos seria na sexta-feira, 21 de agosto de 1987.

Eu trabalhava de madrugada e não conseguia dormir cedo como os normais mortais, pois meu corpo havia se acostumado àquele novo horário. No dia 17, cheguei em casa lá pelas 10 da noite e lembrei que na sexta seguinte faria o recital. O que precisava fazer? Repassar os poemas e cristalizá-los para que nada desse errado na sexta. O que fiz? Uma garrafa térmica de café. Na cozinha da minha casa onde morava na época – na Rua Morato Coelho, naqueles predinhos antigos de três andares entre as Ruas Artur de Azevedo e Teodoro Sampaio – repassei o excerto daquele espetáculo do Grupo Luz. Eu havia gravado uma trilha sonora que faria fundo para a minha performance.

Devo ter começado por volta da meia-noite. Liguei o gravador e fui sobrepondo, melimetricamente, a minha voz sobre a trilha sonora. Naquela madrugada do dia 17 de agosto eu passei e repassei todos os poemas do meu roteiro. Lá pelas tantas, fui dormir exausto e feliz com tanta poesia na minha cabeça.

Acordei por volta do meio-dia, tomei o meu café e recebi um telefonema. Oi Dirceu...  Você viu quem morreu ontem? Não. Quem? O Drummond. Emudeci. Eu não havia assistido ao Jornal Nacional daquela segunda-feira, 17 de agosto, que, soube depois, havia feito uma bonita homenagem ao poeta.

Resumo: enquanto o poeta era velado no Rio de Janeiro, eu declamava seus versos na cozinha da minha casa. Confesso aqui que nunca disse tão bem os versos do nosso Drummond. Na sexta fiz o meu recital para os alunos da amiga Neide. Comecei dizendo que nunca imaginamos que aquele recital seria uma homenagem póstuma. E não foi. Depois do intróito, a noite foi pura emoção. Os alunos mergulharam comigo no universo drummoniano e só quem estava lá pode testemunhar o quanto aquela noite foi especial para todo mundo.

Para terminar, resta dizer o último verso do poeta com que terminei o meu recital:

Memória

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.

Esta é uma das muitas lições que aprendi nesta vida com a poesia: "As coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Picasso e Martinelli


Dirceu Rodrigues, Luiza Pastor e Elias Tobias  no Martinelli, em 1985
Por conta do Blog, voltei a me encontrar com a amiga Luiza Pastor... no Facebook. Temos trocado lembranças sobre o hiato que nos separa desde que trabalhamos juntos no início dos anos 80. Depois, cada um foi para um lado e se perdeu nesta cidade maluca. Nestes anos, pouco nos vimos, mas nas vezes em que isso ocorreu foi sempre uma grande alegria reencontrar a amiga.

Numa das últimas conversas prometi a Luiza que qualquer dia contaria no blog alguma história daquele nosso tempo. Vamos lá. Luiza sempre foi linda, brava (como toda espanhola) e doce (o reverso da moeda). Quando ela foi apresentada à redação no seu primeiro dia de trabalho, foi paixão à primeira vista. De pronto, a convidei para o meu aniversário no fim de semana. Luiza não só foi à festa como me levou de presente uma super impressão em tela de uma das obras de Picasso, comprada no Museu de Arte de Nova York. A tela está comigo até hoje e é um dos presentes mais lindos que ganhei, comparado apenas às máscaras gregas trazidas direto de Atenas por Vassiliki Thomas Constantinidou, outra amiga daquele do trabalho.

As feras daquela redação eram demais: a chefe Maia Amália Krause, hoje de volta à sua Joinville, em Santa Catarina; a portuguesa Marili Ribeiro, hoje repórter especial do Estadão; o mestre de todos nós Pedro Medeiros, que nos deixou em 2007; Ana Dora Partos, na arte, que fez Cásper Líbero comigo; Elias Tobias, que não só ilustrava nossas publicações, como brindava a todos com hilários cartões de aniversário (tenho uma coleção dos meus 9 de julhos guardada); Ana Clara Lemos, que também fez Cásper comigo; o poeta Edmilson Costa, que se candidatou a prefeito de São Paulo na última eleição; e a Vassi, que lançou recentemente o livro Os guardiões das lembranças – memória e histórias dos imigrantes gregos no Brasil.

Dividimos a redação na Rua Boa Vista durante quatro anos. Nossa diversão era almoçar, ver as lojas ou fazer um tour informal pelo centro velho da cidade. O terraço do Edifício Martinelli era o nosso point predileto. Tanto que num verão de 85 fizemos a nossa sessão de fotos: Luiza, Elias e eu. Elas hibernaram em minha gaveta até hoje, quando as libertei direto para o scanner, para poder colocar no blog. Quanta saudade! Lembro como se fosse hoje. Na foto da esquerda Luiza e eu tentamos imitar Chaplin em seu clássico O Garoto. Na outra, deixamos a câmera no automático para clicar o trio para a posteridade.

Ah, não posso deixar de contar uma história engraçada que aconteceu no casamento de Luiza com Eduardo Holanda. Foi uma igreja de um colégio que fica no final da Rua Pamplona. Era verão e todo mundo estava super chique, naquele calor insuportável. Quando o padre começou a dizer: Luiza, aceita Eduardo como seu legítimo esposo... um dos padrinhos desmaiou. Todo mundo correu para acudi-lo. Soltaram a gravata, abanaram, levaram-no para a sacristia e a cerimônia recomeçou com o padre dizendo: retomando... Luiza, aceita...

Luiza me disse no Facebook: “outro dia minha filha queria tirar fotos em algum lugar da cidade e eu sugeri que fosse lá em cima, no Martinelli. Deu saudade!”

Pra mim também, querida! Volte para cima e reveja as nossas fotos e mostre para a sua filha este clic feito num certo verão naquela São Paulo que era uma cidade bem mais habitável que a de hoje.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O Toreador

Ontem de manhã tentei ler o jornal no ônibus. Não consegui. Minha leitura e, talvez, a dos demais passageiros, foi interrompida pelo toque (daqueles bem escandalosos) do celular de uma passageira. Até aí tudo bem. Todo mundo ouve e imagina que ela irá atender rapidinho e falar com seu interlocutor bem baixinho, para que ninguém fique sabendo o teor da conversa. Que nada! Acho que aquela passageira ignorou o seu interlocutor e desandou a falar ALTOOOOO e sem parar. Contava o encontro na balada na noite anterior nos mínimos detalhes: do quanto o “cara” era um gato; até que hora eles ficaram juntos; que já haviam marcado para a próxima sexta; blá blá blá; blá blá blá; blá blá blá.

A tortura demorou até o meu ponto no metrô onde, finalmente, pude ler as notícias do dia. Uma delas dizia que a Anatel vai acrescentar um nono dígito nos números de celular de São Paulo. O objetivo da medida é resolver o problema de escassez de numeração em São Paulo. Segundo a agência, com isso a capacidade de numeração poderá chegar a 370 milhões de linhas. Tudo isso? Arghhhh! Imaginei então um ônibus de garotas como aquela comentando suas aventuras e eu tentando ler o meu jornal.

Lembro de um almoço na La Baguette com o meu amigo Pedro D´Alessio em 1993. De repente entrou um cara bem vestido foi até nossa mesa e ofereceu o “negócio”. Abriu uma maleta e lá estava ele: o celular. Nossos olhos brilharam quando nos deparamos com aqueles lindos e enormes celulares de primeira geração à nossa frente. O aparelho e duas baterias custavam uma fortuna, exceto a linha, que teria de ser outro investimento. Para mim era o sonho do celular próprio. Eu teria que juntar minha poupança, resgatar o fundo de garantia e financiar o restante em dez anos. D´Alessio não resistiu e fechou negócio.

Na mesma época fui ver o filme O Jogador, de Robert Altman. Um dos coadjuvantes do filme era... o celular. Pela primeira vez no cinema ele apareceu numa cena em que o personagem de Tim Robbins fica circundando a casa da personagem de Greta Scacchi ao celular. Um voyeurismo excitante. Ele a vê e segue seus passos e expressões. Acho que até então, ninguém havia imaginado isso ser possível.

Histórias engraçadas ou constrangimentos ao celular todo mundo tem uma para contar. Eu tenho duas. Uma delas eu testemunhei. No segundo movimento de uma peça regida por John Neschling na Sala São Paulo, quando a música está ainda engatinhando, o celular toca dentro de uma bolsa enorme de uma perua. Imediatamente, com um gesto rápido, Neschling interrompe o concerto e vira-se de seu pódio para aquela bolsa. Não diz nada. Apenas fuzila a perua com o olhar. O maridão roxo, a plateia naquele burburinho e a perua desesperada atrás do botãozinho que desliga o aparelho. Depois de intermináveis minutos cheios de segundos dentro, o maestro volta para a orquestra e reinicia o movimento... da capo.

A outra me contaram e também aconteceu numa orquestra, a do Teatro Municipal de Sâo Paulo. Essa foi pior. Um dos contrabaixistas chegou atrasado. O maestro já estava pronto para iniciar o concerto e ele entra esbaforido, toma seu lugar, coloca sua bolsa ao pé daquele instrumento enorme e recebe um olhar fustigante do maestro. Começa o concerto e lá pelas tantas o celular do músico lá embaixo, dentro da bolsa, resolve fazer um solo: O Toreador, a mais famosa ária de Carmem, de Bizet. Imagina o desespero do músico que estava lá em cima no contrabaixo, tendo que se desvencilhar do instrumento, do arco, abaixar, abrir a bolsa, encontrar o celular e desligá-lo. Ufa, fiquei cansado.   

Na semana passada liguei para o meu amigo Pedro D´Alessio. Oi Pedro, tudo certo! Quanto tempo! Tentei ligar na sua casa. Você está em São Paulo? Não, Dirceu, estou em Montevidéu. Uruguai? Como eu poderia imaginar naquele almoço de 1993 que aquele aparelhinho romperia fronteiras e que de nada adiantaria tentarmos nos esconder, o Toreador sempre nos encontra.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Cadeira de Balanço

Num canto esquecido da sala
Dorme tua ausência
(Cadeira de balanço).

O ranger noite adentro
A trazer insônia.

A saudade do que somos,
Do que poderíamos ter sido
E não fomos,
Vem-me nos sonhos
(Sonhos que custam a chegar).

Num canto esquecido da sala
Dorme tua ausência
(Cadeira de balanço)

No ranger constante,
Restos de ti
Ainda impregnados em mim:

Tua cabeça, olhos teus,
Teus cabelos, boca tua,
Teus seios, tuas mãos...
...ah, teu cheiro!

Como tecer o desenlace?

Se já abri as janelas,
Se já pintei as paredes,
Se já troquei os lençóis...
Se já mudei de casa.

Num canto esquecido de sala
Dorme tua ausência
(Cadeira de balanço).

O ranger intermitente
Como que anunciando,
O inexorável que és.

Range, cadeira,
Range, saudade matadeira.

Cadeira de Balanço também é um poema do meu livro Canto em Si, publicado em 1978.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Tout Puissant Mazembe

Vi pela internet que os deuses do futebol aprontaram mais uma vez. Quase não acreditei que o Internacional de POA perdeu para o Mazembe por 2x0. O time do Congo não só venceu a partida, como todos os prognósticos dos cadernos de esportes dos jornais de hoje e de metade do Rio Grande do Sul, que anteciparam que os colorados estariam na final contra o vencedor do jogo de amanhã entre Inter de Milão e o Seongnam.

Para completar a tragédia só falta na tarde desta quarta-feira o time da Coreia do Sul eliminar os italianos e disputar a final contra o time africano. Aí sim, seria uma final para entrar para a história e sacramentar de vez a derrota dos prognósticos.
Quando terminei de ler a notícia às quatro da tarde, quis saber mais sobre os bravos congolenses. Celso Roth e seus comandados deveriam ter feito a mesma pesquisa que eu. Está lá na internet com todas as letras... em francês: Tout Puissant Mazembe. Sim, o time é conhecido como o Todo Poderoso Mazembe. Foi fundado em 1932 por monges beneditinos e seu padroeiro é São Jorge.
São Jorge? Será que a vitória de hoje do Mazembe, e uma possível vitória na final no final de semana, seja uma vingança de São Jorge por não ter conseguido fazer com que o seu Timão ganhasse um título sequer no ano de seu centenário? Esperemos para ver.

Cheguei em casa e vi no Jornal Nacional os congolenses do Mazembe ajoelhados em baixo da trave nos inícios do primeiro e do segundo tempo. Foi para fechar o gol? Deu certo. Fecharam. Inter, exceto os torcedores do Grêmio, todos nós torcemos para você jogar a final rumo ao bicampeonato. A mandinga dos gremistas ou a união do congolenses foi maior e deu no que deu.
Enfim, nesta terça-feira, 14 de dezembro de 2010, a FIFA teve que correr para alterar o mapa do mundo do futebol. O Congo agora está lá e em primeiro plano, enquanto o Inter de POA vê adiado o sonho de ser bicampeão no Mundial de Clubes e dorme com o pesadelo tenebroso de ter vivido o maior vexame da sua história.
Allons, Todo Poderoso Mazembe... rumo à final histórica.

Eu? Ah, eu sou Mazembe desde pequenininho.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Era uma vez Leone e Morricone na América

Jennifer Connelly, em sua primeira aparição no cinema.
 Li, não me lembro onde, que antes de serem iniciadas as filmagens de Era uma vez na América (Once Upon a Time in America, 1984) Robert de Niro procurou o diretor Sergio Leone para mostrar a composição que fizera de seu personagem David Aaronson, o Noodles. Leone teria dito ao ator que ele não precisaria compor nada, bastava ouvir a trilha de Ennio Morricone.

Era uma vez na América é um dos meus filmes prediletos. Lembro que quando terminou a sessão no confortável Cine Bristol, lá no Center 3 antes do incêndio, eu não havia me dado conta que ficara olhos grudados na telona durante quatro horas e nem sentira o tempo passar.

Para contar a história de dois amigos judeus que crescem juntos, cometendo pequenos crimes nas ruas de Nova Iorque, e enriquecem durante a lei seca, Leone chamou Ennio Morricone, seu parceiro de muitos outros sucessos para assinar a trilha. Ela é espetacular. O Tema de Deborah emociona e o tema dos meninos, em que o compositor utilizou uma flauta de pan, é fantástico, até quando o recurso utilizado no filme foi somente com o assovio dos personagens quando garotos.

Não me canso de ouvir o DVD Morricone por Morricone, lançado em 2007, com o próprio Morricone regendo a Orquestra Filarmônica de Munique. Além dos temas de Era uma vez na América, estão no DVD, entre outros, os temas de Os Intocáveis, Cinema Paradiso, A Missão, Quando Explode a Vingança e mais clássico de todos: Três Homens em Conflito.

Voltando a Era uma vez na América, este foi o canto derradeiro de Sergio Leone. O diretor morreu em 1989 deixando uma obra irretocável e passando para a história como o pai do western spaghetti. Depois de Era uma vez na América acho que nunca mais houve um flashback, como o do início do filme, como aquele. Lembremos:

O filme começa com alguns assassinos tentando encontrar Noodles. Onde está Noodles? Num teatro chinês fumando ópio. Ele tem nas mãos um jornal onde se pode ler a notícia da morte de três pessoas. Noodles tenta descansar, mas o som de uma campainha de telefone, apenas em sua mente, o desperta. Noodles volta a fumar ópio e quando olha para a lamparina do teatro chinês, mergulha num flashback até um local onde um caminhão incendiado concentra as atenções de policiais, bombeiros e curiosos.

Lá, três corpos estão estendidos no chão, um deles calcinado. São os três homens estampados na notícia de jornal. Toda esta cena é pontuada pelo insuportável barulho da campainha do telefone. Noodles assiste à cena misturado à multidão. Através do seu olhar, Leone nos leva num flashback dentro do flashback. A câmera vai para uma festa onde os mortos estão vivos numa festa celebrando a proibição da venda de bebidas alcoólicas. O telefone continua tocando.

Noodles também está nesta festa e beija o pescoço de uma mulher. Em seguida, vai até o escritório e direto para o telefone – não o que está tocando insistentemente. Noodles levanta o fone e faz uma chamada para um sargento da polícia de Nova Iorque. Este, sim, é o toque de campainha que soa desde o início do flashback. Quando o policial atende, o toque da campainha para e Noodles desperta no teatro chinês, terminando os dois flashbacks em simultâneo.

Para quem não viu Era uma vez na América, desculpas por eu ter revelado o início do filme. Mas lembrem-se, são quatro horas de filme e muita coisa irá acontecer até o surpreendente final. Todo ele, é claro, ponteado pela trilha sonora inesquecível de Morricone.

Faltou falar do timaço de atores que trabalha no filme. Além de Robert de Niro brilham, entre outros, James Woods, Elizabeth McGovern, Tuesday Weld, Treat Williams, Joe Pesci, Danny Aiello, William Forsythe, James Russo e Jennifer Connelly, em sua primeira aparição no cinema. Ela faz a jovem Deborah. A cena em que Noodles a espia dançando por um buraco na parede é uma das mais belas do cinema.

Os amigos judeus de Era uma vez na América eram muito violentos. Tanto, que se eles se juntassem aos Bastardos Inglórios de Tarantino, aí sim, os nazistas estariam perdidos.

Para a Kátia que, como eu, ela é apaixonada por Era uma vez na América. Ela ganha de mim, pois tem o filme em VHS e a trilha do Morricone em vinil.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Trem Tempo

Para abrir a semana, deixo o poema Trem Tempo, do livro Canto em Si, que publiquei lá atrás, nos tempos da Cásper Líbero. Aliás, neste blog, pretendo contar muitas histórias, inventar outras e, de vez em quando, publicar algum poema daquele livro esgotado e que pouca gente conhece. Uma boa semana para todos.

Tem trem tem trem
Levando a mente a montes.

Tem trem tem trem
Trazendo a saudade
Do meu bem.

Tem trem tem trem
Vindo vindo vindo
De verdes vales
Indo indo indo
Aos vales da mente
Infinitamente.

Fumaça no ar.
Lá vem, menino, o trem
Num único caminho
Uma só chegada.

Tem trem tem trem

Túnel:

Escureceu o dia
O meio-dia em flor
Ai, que saudades
Da claridade dos olhos
Do meu amor.

Próxima parada
Soledad.
Ai, que solidão esquisita.

Próxima parada libertad.
Ai, liberdade que inexiste.

Vai não vou sim vai não vou sim
Vou sim
Em busca de bosques
Com casa no monte,
Para ver o trem e o tempo,
O tempo todo. 

Trem Tempo é um poema do meu livro Canto em Si, publicado por minha conta e risco em 1978. Ele foi musicado por Nicole Borger em 2005 e faz parte do CD Singrar da compositora.

sábado, 11 de dezembro de 2010

Buena Hora

Pelo décimo dia consecutivo, o Farol de San Felician amanheceu totalmente coberto por densas nuvens e sem nenhum sintoma que indicasse que o tempo bom retornaria. Assim, permaneceu até por volta do meio-dia, quando as águas resolveram se precipitar de vez sobre o arquipélago. Ruiz Sebastian começava a ficar preocupado com a sua situação solitária de faroleiro, pois praticamente já havia dez dias que não pegava no sono nem recebia a visita do velho Piero que, pelo menos, de dois em dois dias, vinha lhe trazer as notícias do povoado.

A madrugada do dia dezenove foi de uma expectativa como há muito Ruiz Sebastian não vivia. Como sempre, entre os dias dezesseis e dezessete, o cargueiro Buena Hora fazia a rota pelo farol a caminho do Sul, levando a carga preciosa de que tanto necessitavam os povoados além de Santa Margarida de la Concepción. O atraso do Buena Hora não era natural, pois, em vinte anos o cargueiro nunca atrasara mais que um dia. E a tempestade e a madrugada trouxeram, além de muitos objetos nas pedras, pensamentos que Ruiz não gostava de pensar.

Ouviu muitas sirenes desconhecidas que lhe soavam como gritos desesperados na noite escura, mas a sirene que mais queria ouvir - a do velho Buena Hora com que o capitão Perez costumava saudá-lo nas noites serenas - não ouviu. As horas demoraram mais para passar na madrugada do dia dezenove e tudo o que Ruiz pediu a Netuno foi que levasse a tempestade para alto mar e trouxesse as noites de calmaria quando ele gostava de singrar todos os mares da sua imaginação.

Dos quase vinte e dois anos que estava no comando do Farol de San Felician, por conta de uma grande desilusão amorosa, Ruiz conseguiu, a exemplo das tartarugas, desenvolver uma dura crosta para proteger a sua solidão. Nem o velho Piero, o único a gozar de sua intimidade, não conseguiu jamais rompê-la. Os assuntos que os dois conversavam diziam respeito às banalidades do povoado, que Ruiz visitava de quinze em quinze dias para se abastecer e rezar na capela de San Sebastian para que o bom tempo guiasse os viajantes. Na cidade, as lendas já corriam soltas sobre o "espanhol do farol", que não conseguira amarrar nenhuma mulher que lhe trouxesse consolo nas noites solitárias no farol.

A tarde já estava caminhando para a noite quando o céu foi se abrindo lentamente. Ruiz correu para a torre e de lá pode vislumbrar o horizonte. Amanhã o tempo abre. Pensou. Afinal, ninguém melhor do que ele para diagnosticar as mazelas daquele mar e as sutilezas da natureza tropical. Conhecia esse mar como a palma de sua mão de marinheiro frustrado, que tinha viajado por tantos mares e que tinha muitas histórias de outras tempestades mais ferozes para contar... Mas esta é outra história pra outra hora. Quem sabe eu conto, em una buena hora.

Da série: lá no fundo do meu baú par o saudoso amigo Pedro Medeiros, que nos deixou exatamente num 9 de julho, dia do meu aniversário.